Segurança pública: o que podemos aprender com Vitória e Diadema?
Em 2000, Diadema (SP) era a 4ª cidade brasileira no ranking de taxas de homicídios, atrás apenas das cidades de Campo Novo de Rondônia (RO), Feliz Natal (MT) e São José do Xingu (MT). Já Vitória (ES), encontrava-se entre as 40 cidades com maior taxa de homicídios do Brasil. Esses municípios conseguiram reverter esse quadro com soluções que até hoje inspiram outras cidades do país.
O modelo consagrado entre os analistas de segurança pública, mas pouco implementado, conta com a maior participação da sociedade, articulação institucional, programas preventivos e intensa avaliação de projetos.
A cidade de Diadema, hoje com 420 mil habitantes, pertence a região da Grande ABC paulista, e tem a economia centrada no polo industrial de produção de autopeças, cosméticos, material de transporte e metalurgia. A capital Vitória, com cerca de 360 mil habitantes, concentra sua economia nas atividades portuária, industrial e mineração. Ambas as cidades, separadas por 748 km de distância, compartilharam os efeitos que a falta de segurança pode acarretar.
À medida que a demanda por segurança começou a crescer nesses municípios, surgiu a necessidade de um órgão para coordenar todos os trabalhos. Em Vitória, primeiro foi criado um núcleo de segurança pública dentro da Secretaria de Cidadania e no ano de 2005 (Lei Municipal 6.529/2005) foi criada a Secretaria de Segurança Municipal de Segurança Urbana (SEMSU). Já Diadema, atribuiu a gestão da segurança do município junto com as ações de bem-estar social na Secretaria de Defesa Social. As duas cidades atribuíram aos órgãos o desenvolvimento de ações para prevenção à violência e à criminalidade, com estratégias na inclusão social.
As ações coordenadas por esses órgãos são fruto da participação da sociedade na tomada de decisão da gestão municipal. Não só Diadema e Vitória implementaram conselhos municipais de segurança pública, outras cidades como Recife (PE) e São Gonçalo (RJ) também utilizaram desse instrumento. Além da participação da social, as ações de prevenção foram elaboradas por meio de articulações institucionais com órgãos da esfera estadual e federal. A composição de conselhos municipais e regionais de segurança pública são importantes para formulação do plano de segurança pública. Apesar dos benefícios que foram coletados, Vitória destituiu seu conselho. Já Diadema permanece com a atuação do conselho, envolvendo a sociedade e o poder público.
Outro mecanismo usualmente adotado é o diagnóstico preciso do problema. A investigação da origem e da causa do problema em segurança pública é fundamental para implementação de ações que tenham retorno para a sociedade. A experiência brasileira nos permite concluir que planos de segurança pública implementados sem o preciso diagnóstico não obtiveram êxito nas suas implementações.
A boa prática de Diadema está associada ao preciso diagnóstico da prefeitura. A gestão pública concluiu que a maioria dos crimes eram praticados entre os horários de 23h00 e 04h00. Essa precisão facilitou a atuação do conselho municipal e da prefeitura. Os debates resultaram na Lei Seca (Lei Municipal 2.107/02), o que estabeleceu o fechamento dos bares a partir das 23h00, contribuindo para queda de 90% dos homicídios da cidade.
O diagnóstico da criminalidade no município depende de fatores sociais e históricos e de como os determinantes da criminalidade são verificados na cidade. A mesma lei, implementada em outro município, certamente não surtiria os mesmos efeitos devido a diferença de diagnóstico.
As prefeituras possuem como grande aliado nos seus planos de segurança as medidas relacionadas à prevenção dos crimes. As medidas como investigação, desarticulação de crime organizado, controle de armas, entre outras, são atribuições dos governos estaduais e federal. Contudo, a depender do diagnóstico do município, pode ser imprescindível a articulação com os demais entes.
A prevenção dos crimes é o grande diferencial nos planos de segurança que alcançaram redução dos homicídios. A explicação do sucesso de políticas de prevenção pode ser analisada sobre a ótica do agressor potencial ou ainda das condições favoráveis que levam o agressor a cometer um crime. Ao identificar as características do agressor potencial, a prevenção consiste em mudar as condições de vida destas pessoas com alto risco de desenvolver comportamentos agressivos ou de cometer delitos.
Vitória mudou o rumo da curva de ascensão dos jovens ao crime utilizando um programa com parceria do governo federal. O programa “Agente Jovem de Desenvolvimento Social e Humano”, hoje agregado ao programa “Terra”, visava a promoção da cidadania de jovens que foram condenados por cometer delitos. Os especialistas em segurança pública ressaltam que projetos de formação profissional, cultural e educativo, além do provimento de saúde, apoio jurídico e assistência social são cruciais para redução do agressor potencial. Nesse sentido, a capital capixaba também inovou ao criar o Centro Integrado de Cidadania (CIC) como a referência para o provimento de todos os serviços que envolve a promoção de direitos humanos e acesso à justiça para os mais desfavorecidos.
A política de prevenção também pode ter uma abordagem na redução das condições favoráveis para um agressor cometer crimes. De acordo com a teoria, se um agressor não encontra as condições favoráveis para cometer um delito, ele buscará a oportunidade em outro lugar. Contudo, se vários ambientes reduzem as condições favoráveis de cometer delitos, é inegável que haverá queda da taxa de crimes. As principais ações que visam essa prevenção articulam políticas de infraestrutura nos bairros, como por exemplo o acesso à iluminação pública nas ruas e a recuperação de espaços públicos. Em municípios de médio e grande porte observa-se também a redução das condições favoráveis com a instalação de câmeras de monitoramento.
No caso de Diadema, houve uma fuga de criminosos para cidades vizinhas, já que a política de prevenção buscava impedir as condições de um delito. O diagnóstico integrado só foi possível pela troca de informações e dados com os outros municípios, promovendo uma melhor coordenação de políticas na região. Os trabalhos conjuntos entre municípios conectados, como regiões metropolitanas, podem ampliar os efeitos de um plano de segurança pública.
Diadema e Vitória conseguiram sucesso na redução dos crimes via a articulação institucional com demais entes públicos e privado, diagnóstico dos problemas de segurança pública, participação da sociedade em conselhos municipais e regionais e atuação sistemática nos programas preventivos. De forma geral, essas cidades alcançaram melhorias nas interações sociais, mudando a forma como geriam seus problemas. A solução encontrada foi a inovação na tomada de decisão, criando um elo equilibrado entre a sociedade e governo.
O principal aprendizado para outras cidades é que ambos municípios internalizam na gestão municipal que as ações de segurança pública são contínuas. A demanda por mais segurança cria as condições para a avaliação sistemática dos projetos executados e a expansão de iniciativas de êxito, ampliando o bem-estar da população.
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Sobre o(a) editor(a) e outras publicações de sua autoria
Nathan Diirr
Graduado em economia pela UFES, mestrando em economia pela mesma universidade. Atua como Gerente de Ambiente de Negócios no Observatório da Indústria. Possui interesses nas áreas de regulação, petróleo e gás natural, infraestrutura e ambiente de negócios.